18 novembro 2007

Crônica do domingo

Mister VHC
Waldir Pedrosa Amorim

Nessas andanças que a vida de um médico dá, conheci um cidadão num encontro sobre hepatites virais, apresentado por um colega amigo. A razão de ali estarmos aparentemente era diversa, meu amigo era cuidador de gente e caçador de vírus da hepatite, assim como eu. Já aquele cidadão, não.

Estávamos em busca das novidades, se é que havia, sobre como espreitar, aniquilar, exorcizar e salvar vítimas de um inimigo mortal chamado Vírus da Hepatite C.

Como sói acontecer em encontros médicos, em filmes policiais e seriados de bang-bang, há momentos em que a platéia de tão embevecida, parece até torcer pelo vilão. Afinal, sem um adversário à altura, que seria de nós, pobres esculápios.

Ninguém falava sobre as pessoas atingidas pelo algoz. Sabia-se de cor e salteado do facínora. Seu nome ressoava com intimidade quer no idioma pátrio, quer no padrasto. Diga-se de passagem, o coitado português sequer figurava no banheiro daquele seleto ambiente, fora substituído por um garrafal WC.

O Sr. HVC poderia sem cerimônia ser tratado como Mr. VHC, tanto fazia.Conheciam-se as entranhas das suas entranhas!

De memória, soletrava-se seu código genético e faziam-se mexericos sobre o seu comportamento como transformista.

Algo se cogitava como providências, estribadas em denúncias da mais pura fidedignidade e em descobertas advindas do além-mar.

Denunciá-lo ao pentágono por reunir-se em células, que com certeza são comunistas. Ser perito em guerra de guerrilhas, ficando na moita e atacando enquanto Bush imaginava havê-lo dizimado. E até por espionar o exército guardião das democracias indefesas, transformando mísseis caríssimos e poderosíssimos, em farinha com água, tapioca, beiju ou mingau de araruta. ─ Inda de sobra, arrefecer os ânimos das tropas adversárias, tornando-as tristes e sorumbáticas. ─ Semear discórdia entre os generais, quanto às estratégias bufas que empreendiam. ─ Engordar a indústria de equipamentos bélicos, enquanto emagrece a dos bens de subsistência.

O pior e mais recente era o fato de andar de caso com as gordinhas, metendo-se a folgazão, com as filhas de Ito, aquele japonês velhaco, dono da fábrica de cola.

De tão fogosas, as meninas agora só querem falar inglês.Quando se pergunta pelo nome da gorda, ela fala: Nash.

─ É tu nada, Maria Pereba! Tas inventando a roda?

─ Tua raça é esteatose.

─ Te conheço desde que me entendo por gente! Sei não! Resmungou um cearense de topete,
num monólogo altissonante.

─ Miltin! Vai lá e fala. Desafiou um maranhense amigo do Sarney.

─ Garanto! Nós o conhecemos muito além do que eu posso lhes dizer, ralhou um gringo com acento saxônico.

─ Afinal, quem na vida resguarda o mundo, senão o nosso garboso serviço de inteligência! Bradou um oriental naturalizado ianque.

─ Estamos no século XXI, tenham certeza! Rosnou um galego nova-iorquino, e proseguiu:

─ Bin-Laden não é mais aquele que surpreendeu nosso imperador na hora do intercurso sexual. Foi puro cochilo erótico, que jamais se repetirá!

─ Quanto mais um virim chinfrim desses! Falou em idioma cearense, nosso Miltin, para todo mundo ouvir!

Mas, voltemos a rememorar as nossas confabulações.

Após tanta discussão e, tantos resultados triunfantes daqui e de alhures, nossa bravata não se dá por finda.

Sessenta por cento de bons resultados; quem sabe, quarenta! Concluía o coordenador do evento.
Ao final, fomos comemorar com um coquetel, tapinhas nos ombros, abraços, cópia de slides e assédio aos onipotentes palestrantes vindos do primeiro mundo.

Enquanto isto, na coxia, o meu amigo que é rio-grandense-do-norte, potiguar dos bons, tendo me apresentado ao cidadão do qual falei, me fez esquecer os repetitivos e inúteis conhecimentos oníricos que me afogavam. E assim retornei ao meu gostoso português, que quase esquecia.

Um senhor made in Bahia, sorridente, com cara de gente do bem, direto, simples, convicto de alguma coisa mais importante que os nossos ternos e gravatas, me foi apresentado como um poeta. Eu sabia que o meu amigo potiguar era poeta, quem não conhece o poeta Gilmar Amorim? Quem desconhece o homem dos pardais? Havendo alguém, precisará urgente tratar de conhecê-lo.

Eu cá que andei cometendo versos bissextos, em pouco tempo recebia um livro de poemas, do meu hoje amigo, Derval Magalhães. Ganhei uma beleza de livro, e de quebra, um amigo especial. Soube ainda que dedicava parte do seu tempo de advogado e promotor de justiça, esclarecendo aos baianos como evitar contrair o vírus da hepatite C. Junto com ele veio o amigo Rômulo, ambos do Grupo Vontade de Viver.

Conversei com meus botões: desses, até Bin Laden tem medo, quanto mais aquele virim de meia tigela.

Prevenção é que espanta doença, concluí.

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