30 abril 2008

Visão metropolitana

Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online):
Ir além do imediato na abordagem dos problemas da cidade
Luciano Siqueira

O gestor público é chamado cotidianamente a imitar os bons poetas – ou seja, a perceber em cada detalhe da vida na cidade, alguns aparentemente sem maior importância ou efêmeros, o que há de essencial (e estrutural). Imitar os bons poetas exatamente por isso: um Drummond, um Vinícius, um Carlos Pena Filho, dentre muitos, enxerga num fato fortuito o que vemos e não enxergamos, revelando aos olhos dos simples mortais, o que há ali de universal...

Neste instante da vida do país, quando se aproxima o pleito municipal, atores políticos dos mais diversos matizes se debruçam sobre os problemas das cidades e são chamados – tenham ou na consciência disso – a uma abordagem que vá além do imediatamente perceptível, na formulação do diagnóstico e na busca de solução.

Desse modo, faz-se oportuno assinalar a íntima relação entre o padrão de vida em nossas cidades e a natureza do desenvolvimento do país. O Brasil hoje é essencialmente urbano. Em apenas cinco décadas, processou-se uma fantástica inversão da relação entre a população rural e a urbana, motivada pela industrialização que começou a tomar corpo nos anos 30 e pela ausência de uma reforma agrária distributiva – ambos fatores de transferência acelerada de populações da área rural para as cidades. Em 1940 residiam nas cidades apenas 31% dos brasileiros; por volta dos anos 80, nas cidades já se encontravam mais de 75% da população. Em 2000, já se estimava em 82% a população urbana, segundo os critérios do IBGE.

Essa rápida ocupação do território urbano se deu (com raríssimas exceções) de maneira desordenada e desigual, refletindo os traços essenciais do capitalismo de tipo dependente, precocemente monopolizado, concentrador da produção, da renda e da riqueza e socialmente excludente que aqui se desenvolveu. O crescimento industrial se apoiou em grande medida no baixo valor da mão de obra abundantemente disponível, sem a contrapartida de oferta suficiente de habitação, equipamentos e serviços e condições sanitárias que propiciassem qualidade de vida aos trabalhadores.

A dimensão territorial do drama urbano brasileiro fica mais evidente quando se considera a existência de grandes aglomerados urbanos, dos quais vinte e seis detêm o status de Região Metropolitana, correspondendo a pouco mais de 460 municípios, que compartilham problemas estruturais como o déficit habitacional, a precariedade dos transportes e de saneamento, o desemprego e a crescente violência criminal.

Nesse contexto, problemas estruturais vivenciados por cidades limítrofes ou integrantes de uma mesma região reclamam soluções que envolvam os três entes federativos – a União, os Estados e os Municípios. O que se tornou possível com a Lei 11.107, de 6 de abril de 2005, que dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos, regulamentada pelo Decreto 6.017, de 17 de janeiro de 2007 procura responder a essa demanda.

É a denominada Lei dos Consórcios Públicos, que possibilita quatro tipos de consórcios: entre Municípios; entre os Municípios e o Estado; entre o Estado e a União; entre os três entes, União, Estado e Município – mediante adesão voluntária e submissão a regras de funcionamento que preservam a autonomia de cada ente federado consignada na Constituição.

Tenho acentuado essa questão no debate sobre os problemas do Recife que, cidade-pólo que é de nossa Região Metropolitana, reflete e concentra os problemas fundamentais do conjunto das cidades que a compõem, que reclamam soluções consorciadas.

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