01 outubro 2011

Tecnologia em excesso intoxica a vida

Aldemir Martins
Ao vivo a vida é bem melhor
Luciano Siqueira

Publicado no Jornal da Besta Fubana

Tudo bem que a revolução tecnológica facilita a vida da gente, sobretudo ao encurtar o tempo das tarefas cotidianas. Tipo comunicar algo a um amigo: o torpedo via celular resolve na hora; ou uma curta mensagem no Twitter.

Mas exagerar não vale. Intoxica a vida, robotiza o contato entre as pessoas, mecaniza os sentimentos.

Nos EUA, onde de há muito escuto falar que as relações humanas padecem de argentária frieza, há duas novidades absolutamente dispensáveis, a meu ver.

Uma é um espelho “inteligente”. Na verdade, uma grande tela de computador. Enquanto você faz a barba, basta tocar em ícones estrategicamente situados para falar ao telefone, verificar seu saldo bancário, saber a previsão do tempo, os filmes em cartaz e coisas assim. Não vejo nenhuma vantagem, pois pode estimular a ansiedade do freguês. E fazê-lo perder esse momento precioso de todas as manhãs, que permite um olho no olho consigo mesmo. Conferir na própria face o estado de espírito no início do novo dia, perceber no olhar emoções nem sempre perceptíveis pelos menos sensíveis.

Com o tal espelho, a barba certamente é mal feita: com uma mão, move-se a lâmina; com a outra, tecla-se na superfície lisa em busca de uma interatividade antecipada com problemas a resolver no curso do dia.

A outra novidade é terrível: a cada dia mais psiquiatras, analistas e psicólogos clínicos optam pelo Skype como meio de relacionamento com os seus pacientes. E, claro, na mesma proporção cresce o contingente de pacientes que se submete a isso. Na mesma linha do que já acontece há tempo em muitos consultórios médicos, em que a bateria de exames laboratoriais tem mais força do que a anamnese e o exame físico cuidadosos.

E o calor humano? Como fica a percepção do olhar, do gesto, da entonação da voz, do modo de vestir, enfim sinais reveladores da personalidade e do estado emocional do paciente? Na prática, analista e cliente recolhem-se a mútuo isolamento ilusoriamente atenuado pela máquina que transmite voz e imagem.

Nessa marcha, podemos chegar ao exagero de tudo fazer e sentir mediante o simples pressionar uma tecla. Rosas à mulher amada, basta a imagem virtual. Para o abraço afetuoso, use aqueles bonequinhos do MSN e assemelhados. Compartilhar segredos ou inquietações, o e-mail e o bate papo pelo Facebook dão conta.

Comigo não, Rosa. Uso intensamente a internet para me informar e me comunicar com as pessoas. E-mail, Facebook, Twitter e mesmo o MSN fazem parte do meu cotidiano como ferramentas que me colocam em tempo real em contato com muita gente. Mas paro por aí. Nada substitui a conversa cumplice e solidária, o encontro, o abraço. Ao vivo e a cores.

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