27 abril 2016

Cobra d'agua com porco espinho

Impeachment e sistema de governo
Luciano Siqueira, no Blog de Jamildo/portal ne10

A tentativa de interromper mandato da presidenta Dilma, inicialmente se fundava no combate à corrupção (sic). O pressuposto era que, se dirigentes de estatais e políticos filiados ao PT, ao PM DB e outros partidos então participantes do governo tinham sido pilhados no mau uso de recursos públicos, mais cedo ou mais tarde levariam de algum modo a implicar Dilma.
Tal não aconteceu, por mais que tentasse o juiz Sérgio Moro e seus colegas do Ministério Público e da Polícia Federal.
Não conseguiram "pegar" a presidenta simplesmente porque ela jamais cometeu ato ilícito.
E se Dilma sequer é indiciada em qualquer processo de corrupção, pois contra ela não pesam nem acusações nem fatos comprovados, como pesaram contra o então presidente Collor, o argumento teria que mudar.
Então se achou o argumento das chamadas "pedaladas fiscais”, tão inconsistente quanto revelador do caráter discricionário da ação contra presidenta.
Desde 1994 o governo federal realiza manejos contábeis até agora considerados legítimos e frequentemente necessários no processo de execução orçamentária. Sem dolo.
Tanto que expediente semelhante vem sendo praticado pela quase totalidade dos governadores de estado.
Mas virou pretexto contra Dilma.
E eis que, passado o tenebroso espetáculo vivido pela Câmara dos Deputados no domingo 17, expressão exata do caráter fisiológico e descomprometido com as normas constitucionais que predomina numa maioria eleita em nome de si mesma, o pedido de impeachment terá que ser examinado, agora rigorosamente em seu mérito, pelo Senado.
E aí, surpreendentemente, senadores de histórico respeitável, como Cristóvão Buarque, antecipam publicamente que votarão pela admissibilidade do processo de impeachment por “razões eminentemente políticas”.
Se isto não é golpe — e parte considerável da opinião pública brasileira e internacional corretamente assim o denuncia -, no mínimo é uma tentativa de exercitar o parlamentarismo dentro do sistema presidencialista!
Ora, se o governo vai mal que se combata o governo e se tente acumular forças para próxima eleição presidencial.
No parlamentarismo, se a maioria do parlamento não o apóia, aprova um “voto de desconfiança” e afasta o chefe do governo, o primeiro-ministro.
Na sequência, o presidente da República extingue temporariamente o parlamento e convoca eleições para que, através do sufrágio universal, nova composição parlamentar se forma e assim se possa escolher novo primeiro-ministro.
Assim é na Itália, na Grécia e na Inglaterra, por exemplo, mas aqui, não: o chefe de governo é o presidente da República, eleito a cada quatro anos.  
Misturar cobra d’água com porco espinho é que não dá: as regras do parlamentarismo não se aplicam ao presidencialismo. Sob pena de golpear a Constituição.
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