17 outubro 2017

Uma crônica para descontrair

Farofeiros nas nuvens
Luciano Siqueira, no Blog da Folha e no Vermelho

Tempo bicudo o que vivemos. Para onde você olha, mais dificuldades aparecem. Nisso há uma absurda convergência nacional.

As empresas de aviação estão completamente sintonizadas com a situação. Além de tratarem o usuário com perversa indiferença, como se pudessem tudo e em troca de tarifas pesadas não devessem oferecer nada mais do que o transporte de um destino a outro, acumulam novidades negativas - contra nós indefesos passageiros.

Além de novos limites de tamanho e peso da bagagem - um artifício para a cobrança de uma taxa a mais –, a antipática substituição do antigo serviço de bordo por um saquinho-de-qualquer-coisa, acompanhado de um mísero copo d'água.

- Doce ou salgado, senhor? Aceita água - com ou sem gelo?

A aeromoça nos aborda como quem faz um imenso favor ou generosa cortesia.

Mas vem o comissário de bordo empurrando o carrinho e nos oferece o cardápio sem graça nem gosto, a preços nada agradáveis. 

Pois bem. Num voo da Gol do Rio de Janeiro ao Recife, nossa delegação - Luci, eu, filha, genro e três netos -, ocorreu a todos que a privação de comes e bebes despertaria, se não fome propriamente dita, talvez o desejo irrefreável de mastigar algo.

E ninguém estava a fim de adquirir nada do insosso e inflacionado menu.

Mal nos sentamos, apertamos o cinto e nos preparamos para a decolagem, bolsas se abriram deixando visíveis pacotinhos de biscoito, chocolates e que tais.

Não deu pra trazer o hambúrguer de Miguel, o cuscuz de Pedro e o arroz branco de Alice. Mas a ração de guloseimas era bem razoável.

- Somos farofeiros nas nuvens!, proclamei de imediato.

E assim percorremos as duas horas e quarenta e cinco minutos que nos levaram do Rio ao Recife nos "achando o máximo", com olhares de superioridade dirigidos aos ocupantes dos assentos mais próximos, eles pobres coitados condenados a sobrevirem a mini bolachinhas e água. 

(Meu genro Alexandre, sempre atento a tudo, jura que surpreendeu, uma fila adiante, uma jovem senhora, muito bem posta, saboreando imensa banana prata).

Karl Marx concebeu a História evoluindo em espiral: a cada época, a Humanidade como que retorna ao ponto de partida para recomeçar novo ciclo, agora em patamar superior. Em matéria de viagem aérea, talvez estejamos vivendo um péssimo tempo de escassez e maus tratos como prolegômeno ao início de novo ciclo, tão farto quanto no áureo tempo da Varig, dos aperitivos e das refeições completas.

Não percamos a esperança. 

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