16 novembro 2017

Manu na IstoÉ

Manuel D’Ávila: “Não há alternativa fora da política”
Revista IstoÉ, por Octávio Costa

Ao nascer sua filha Laura, a deputada estadual Manuela D’Ávila, da Assembléia gaúcha, comunicou à direção do PCdoB que dedicaria 1000 dias de exclusividade à primogênita. Só assumiria compromissos oficiais vencido esse prazo. Viu-se, porém, forçada a antecipar o fim da quarentena por motivo de força maior. Laura ainda tem dois anos e dois meses, mas Manuela foi convocada por seu partido para disputar a Presidência da República em 2018. Aos 36 anos e 20 de militância, a ex-deputada federal assumiu a missão com muito gosto. “O PCdoB tem grandes nomes e eu me sinto honrada por ter sido a escolhida”. Diante da tendência mundial de se buscar nomes sem vínculos partidários, ela afirma que “é contraditório dizer que alguém fora da política vá resolver a crise brasileira”. Quanto aos comentários de que o PCdoB vai retirar a candidatura própria no caso de o ex-presidente Lula concorrer, Manuela descarta tal decisão: “Minha candidatura tem relação com nossas bandeiras. A unidade com o PT pode se dar no segundo turno”. Pelo visto, a pequena Laura terá de dividir a presença de sua mãe com a campanha à Presidência.
Sua candidatura é para valer mesmo ou é uma tentativa de marcar posição?
O País tem 13 milhões de desempregados, 60 mil pessoas perdem a vida por morte violenta, no trânsito ou por arma de fogo. Seria muita irresponsabilidade lançar uma candidatura só para marcar posição. O PCdoB é um partido com uma história muito longa e de muita responsabilidade. Nós temos 95 anos de vida política. Apenas uma vez pela sigla, lançamos candidatura à Presidência, com o Yedo Fiúza (ex-prefeito de Petrópolis-RJ) em 1945. Não faríamos uma candidatura apenas para marcar posição. Achamos que é o momento de nós apresentarmos saída para a crise.
Não é uma responsabilidade muito grande para a senhora sair como presidente?
Sempre acho as responsabilidades que o meu partido me deu muito grandes. Para qualquer brasileiro ou brasileira, a responsabilidade de ser pré-candidato a presidente é infinitamente grande. Para mim, não é maior
do que para nenhum outro que tenha noção das responsabilidades e dos desafios que é pensar o Brasil e discutir a saída da crise para com o nosso povo.
Por que escolheram o seu nome já que o partido tem quadros históricos?
Eu tenho 20 anos de militância no partido e acredito que nossa direção avaliou todos os nossos nomes. Tínhamos muitos outros nomes com qualidade política: como é o caso de Jandira Feghali (deputada federal) e da senadora Vanessa (Grazziotin). O próprio governador do Maranhão, Flávio Dino, poderia ser um nome natural. Mas achamos que o desafio dele no Estado é muito grande e pedimos para que ele não concorresse à eleição. A direção do partido, então, chegou à conclusão de que eu aglutinaria as melhores condições nesse momento. Para mim, é motivo de muita honra.
Qual é a principal bandeira da sua campanha?
O centro do debate da eleição deve ser as saídas para a crise e a construção de uma unidade da nação, que nós chamamos de frente ampla e popular, para unir o país, nosso povo, em torno de saídas para a crise. Acreditamos que é importante que o país debata a retomada do seu crescimento. Qual o papel do Estado na retomada desse crescimento. Defendemos também o debate profundo sobre medidas que Temer tomou e que prejudicam as cadeias produtivas mais dinâmicas do Brasil e a indústria nacional, como é o caso da TJLP (taxa de juros de longo prazo) e das operações no BNDES. Esse debate tem muito a ver com a nossa juventude. A gente tem uma leva de jovens brasileiros que acaba deixando o País pelo processo de desindustrialização. Queremos debater como nós vamos fazer para encontrar saídas enquanto nação.
Num programa recente, o PCdoB deu muita ênfase à questão do capital estrangeiro. Fez lembrar as músicas da UNE com menção ao “entreguismo”. A senhora acha que esse é um ponto importante?
Quando falamos sobre a revogação dessas medidas de Temer, a gente discute justamente isso: o que o Temer tem feito com a economia brasileira. Como essas saídas vão reforçar a nação, garantir a nossa soberania e desenvolvimento? Não existe nação desenvolvida sem soberania e sem indústria. É preciso investir nas nossas indústrias.
A senhora deve ser a candidata mais jovem. Acha que isso pode atrair o apoio dos jovens a sua candidatura?
Como a política brasileira é composta por gente muito acima da minha idade, parece que estou sempre jovem. Acho que os jovens brasileiros têm preocupação em qual país eles vão viver. A eleição não pode ser um espaço de acirramento de crise, mas um espaço de construção e soluções. Os jovens terão interesse em discutir isso porque nós também temos essa preocupação.
Ao mesmo tempo, fala-se muito da tendência de buscar um nome novo para a política, o que faz surgirem nomes fora da política, como o do apresentador Luciano Huck. A senhora acha que isso pode prejudicar sua campanha?
Todos esses nomes merecem respeito. Mas a gente precisa entender que não existem nomes por fora da política. O problema do Brasil é político. Não vai se resolver essa crise por fora da política. É contraditório dizer que alguém fora da política vá resolver a crise brasileira. Essa pessoa não vai se sentar com os presidentes de outros países? Não vai se sentar com setores econômicos do nosso país? Isso é fazer política.
O PCdoB tem 95 anos e, além disso, é um partido marxista. Isso não conflita com a atual tendência de se buscar nomes novos na política?
Eu acho que nós somos o novo. A crise que estamos vivendo é a crise do capitalismo, esse sistema que tem
levados milhares de jovens brasileiros à morte, por causas violentas, que se mantém a partir da desigualdade social.
A senhora é marxista?
Eu sou. Se não fosse, não seria filiada ao PCdoB desde os meus 16 anos.
A Revolução Russa nesse cenário ainda serve de exemplo para sua militância política?
Marcou esse século. Óbvio que nos inspira. Mas os erros do processo da revolução também nos ensinam. Tem gente que não aprende com os erros. Sobretudo, aqueles que tentam repetir as saídas para a crise iguais as de 1929. Não há modelo de socialismo de um país para o outro. Foi isso que aprendemos com a Revolução Russa.
Se o ex-presidente Lula tiver a candidatura confirmada, a senhora vai continuar com a sua?
Nossa candidatura não tem relação com os debates dos outros partidos. Ela é fruto da relação com as nossas bandeiras: dos problemas que nós identificamos no Brasil e das soluções que nós acreditamos serem possíveis para o país. A não participação de Lula no processo eleitoral seria o símbolo do agravamento da crise institucional. Essa unidade com o PT pode se dar num segundo turno das eleições.
Mas essa decisão não seria da senhora. Seria da direção do partido?
Todas as decisões nossas são do partido. Como aconteceu na minha candidatura. Fazemos as coisas de forma coletiva. Isso é o mais adequado: que as pessoas não se julguem salvadoras da pátria. Não sou uma candidata de mim.
A senhora afirmou que não admitiria ser vice do Lula. Por quê?
Não falei isso. Falei que sou candidata a presidente. Ninguém se lança candidato a presidente, com o seu programa, para ser vice.
Existe um fato novo nessa eleição que é um candidato assumidamente de direita, com posições que batem de frente com o pensamento da esquerda, que é o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Como a senhora avalia a candidatura dele?
Na verdade, ele bate de frente com as ideias de uma direita liberal. Representa um tipo de direita que é ultraconservadora e que beira o fascismo. Muitas vezes, se manifesta dessa forma. Ele fere tudo que nós conquistamos de positivo, do respeito às instituições, do reforço aos direitos individuais. O mais grave nisso é a ideia de que a crise não tem uma saída e que precisa ser acirrada. Isso que ele estimula na sociedade.
A senhora acha que a candidatura dele não prospera?
Eu acho que, na hora que começarmos a fazer um debate sobre o Brasil, as pessoas perceberão que ele é uma antítese da esperança que nós precisamos ter para a construção de um Brasil melhor. Ele é o agravamento da crise.
E quanto aos tucanos, que são tradicionais adversários, sempre no segundo turno contra o PT, a senhora acha que pode ocorrer novamente esse enfrentamento?
É uma eleição absolutamente aberta. Não me precipitaria em fazer uma análise sobre esse bolo todo de uma eleição que ainda não tem nem o seu primeiro turno consumido, com todas as peças.
Os candidatos principais do PSDB, que são o prefeito João Dória e governador Geraldo Alckmin, têm a
vantagem de sair de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país…
Eles nem se acertaram entre eles. Como é que a gente vai falar sobre a candidatura deles?
A senhora tinha largado Brasília dizendo que queria voltar a sua terra. Como é que se explica sua entrada numa disputa acirradíssima e que envolve a possibilidade de voltar à capital federal?
Adoro ser deputada estadual. Voltei para cá porque tenho compromisso com meu estado, que vive uma situação econômica bastante difícil. Não concorri à prefeita e nem para deputada federal porque minha filha tinha seis meses de vida. Eu achava que aquilo seria errado para o que eu acredito sobre a maternidade. A minha filha agora tem dois anos e dois meses. Ela já conversa. Ontem (quinta-feira 8), quando eu fui a Brasília, ela me mandou um vídeo dizendo: ‘a mamãe tá num trabalho grande’. Quase se passaram os meus 1000 primeiros dias (de exclusividade à primogênita). Como, por duas vezes, eles foram acolhedores com as minhas decisões pessoais, eu também achei que era o momento de eu ouvir o debate que eles estavam fazendo sobre o meu nome com tranquilidade.
Como a senhora pretende lidar com a questão do machismo?
A gente não lida. A gente enfrenta o machismo. O tempo inteiro, nós vivemos com isso. Não tenho orgulho de dizer isso, mas eu me tornei alguém forte para lidar com o machismo porque eu tenho mandato desde os 22 anos.

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